Alguém conhece a obra de Zygmund Bauman chamada: A Leveza do Ser, Relações Líquidas?

Gostaria muito de conversar com pessoas que gostam da definição das relações modernas como "líquidas" ou "gasosas", ou seja, fluidas.
Para quem não conhece essa obra FASCINANTE, o autor diz que a solidez das relações, ou seja, inalteradas com o passar do tempo não condiz mais com a realidade atual, e que, conforme tempo, informação, necessidades e desejos são conceitos mutáveis, as relações também se tornam mais fluidas, como sabemos bem: com data de validade curta.
O que é fato é que hoje, sabemos bem que está cada vez mais complicado encontrar relacionamentos de longa duração, por diversos fatores, seja porque a convivência com o outro acaba não sendo muito do que esperamos, seja porque cada vez mais tardiamente uma relação se torna algo importante na vida, muitos focados em carreira (confesso que sempre fui assim), outros simplesmente não sentindo bem consigo mesmo e consequentemente não mantendo relação sustentável por muito tempo.
As necessidades vão mudando e a maioria vai tentando achar outrXs pessoas para ocupar o vão ao seu lado para lhe fazer feliz. Balela colocar uma carga tão grande de responsabilidade nas costas dX parceirX, a gente mal sabe SE fazer feliz e quer que nos façam? Quase não questionamos isso né? O que ME faz feliz e porque eu não estou ME fazendo feliz?
O livro do Bauman vai bem além disso, deixo aqui registrado que isso não é um depoimento de alguém traumatizado ou com pavor de relacionamentos, mesmo porque papai e mamãe são casados a 44 anos e são exemplo de matrimônio saudável.
O que gostaria é de saber se tem alguém que já parou para ver em sua vida que os amores sempre foram líquidos e está tudo bem, aceitou e passou pra outra fase.
Beijos de luz.

Leandrob13 escreveu:

Alguém conhece a obra de Zygmund Bauman chamada: A Leveza do Ser, Relações Líquidas?

Eu conheço o autor e sei que ele tem uma série de livros sobre a liquidez das coisas no mundo (Relações Líquidas, Modernidade Líquida e outros). Eu já li "Amor Líquido" e pretendo ler algum outro livro dele apesar de não ter achado que a leitura tenha fluído bem (desculpe o trocadilho). Mesmo assim, gostei bastante das ideias dele e concordei com muito pesar. Enxergar a realidade quebra muito das nossas idealizações.

Acho que já aceitei essa liquidez das relações a ponto de desanimar de muitas coisas. Também aceitei a ponto de sofrer menos quando aceito as coisas com mais facilidade.

Leandrob13 escreveu:

Balela colocar uma carga tão grande de responsabilidade nas costas dX parceirX, a gente mal sabe SE fazer feliz e quer que nos façam?

Concordo com essa questão de não colocar toda a responsabilidade no outro, aliás acho que algumas vezes essa fluidez não tem culpado e é só a natureza seguindo seu curso.

Já ouvi falar desse conceito, e pra mim faz bastante sentido. São tempos onde tudo é muito vago, isso em todas as relações humanas. Vejo por aí pelas redes sociais, as pessoas se 'cancelando' por conta de desentendimentos. E isso é bem o reflexo dessa liquidez. Mas eu fico pensando se isso é somente um fruto do nosso mundo contemporâneo e tecnológico ou se as coisas sempre foram assim mas não era percebido? Já que relacionamentos anteriormente era algo muito mais rígido e até obrigatório.
Me parece um bom tema, pretendo ler algum dia

Obrigado por trazer essa dica de autor Leandrob13!!!!
Então, eu não conheço esse autor, vou incluir alguns livros dele em minha lista, mas concordo com estas ideias e já venho batendo nessa tecla a algum tempo. Infelizmente , não sei qual exatamente seria a razão, mas as relações estão ficando cada vez mais superficiais ou líquidas como vc mencionou. Não estamos tendo mais relações fortes e duradoura e fico imaginando para onde estamos caminhando.
No meu caso, sempre fui de poucos amigos, mas os que fiz e faço são pra vida toda, mesmo que fique muito tempo sem ve-los.
É triste? É, mas realidade.
Esses dias conversando com uma amiga, eu contava que por causa de pouca coisa, eu corto totalmente qualquer contato com pessoas que perturbam minha paz ou que já é certo a incompatibilidade, e ela me perguntou: - Como vc ainda é meu amigo? Eu te encho o saco o tempo todo? Respondi que talvez quando uma relação tem força pra ser, sem julgamentos, tem apoio mútuo sem julgamentos, é isso que nutri a relação. Simplesmente vc está ali pq quer estar sem nada esperar.
Essa minha amiga a conheci pela net já tem uns 7 anos e é raro nos vermos pessoalmente, mas desde o início eu a considero a irmã que nunca tive.
Mas vou te falar que, hoje em dia, por causa da correria talvez, está bem difícil de formar novos laços e relações de qualidade.

Eu nunca li Bauman mas conheço bem a obra de tanto que falaram pra mim.
Queria ler para fazer um contraponto.

Nunca li o bauman, mas o conceito parece interessante. E Eu recomendo ler qualquer coisa do Dan Aliery sobre relacionamentos, apps de encontro e afins

Oi Leandro, eu conheço bem o Bauman, sou formado da área da sociologia, tive que ler uma porção de obras dele durante graduação e pós (Amor Líquido, Vida Líquida e etc) e digamos que ele não é exatamente respeitado no nosso campo, porque apesar dele ser sim um sociólogo, as observações que ele faz para construir o conceito de liquidez não são baseadas numa observação sistemática e transcultural das relações humanas - o método dele se aproxima mais de meditações meio filosóficas, só que sem o rigor que a filosofia exige.

O problema da linha temática do Bauman não reside tanto na noção de liquidez das relações humanas (que é sim um conceito muito interessante), mas em ele assumir que fomos modernos em algum momento de nossa história. É um ponto bem pacífico nas ciências sociais que "Jamais Fomos Modernos", essa expressão em si sendo o título de um livro de um autor chamado Bruno Latour, que - ele sim - utilizou de observação sistemática e levantamentos produzidos ao longo de anos para defender com solidez a ideia de que a modernidade é um projeto que nunca foi realizado, nem sequer parcialmente. Além disso, seria mais correto afirmar que o período ao qual Bauman se refere é a pós-modernidade, porque historicamente os edifícios filosóficos e conceituais construídos durante o projeto de modernidade já estão todos esfacelados - sexualidade (Foucault), raça (Lévi-Strauss, Stuart Hall), linguagem (Derrida), o real (Baudrillard), etc. Por exemplo, o atual reconhecimento da assexualidade é filhote da superação do projeto da modernidade, que preconizava somente uma sexualidade - a heterossexualidade.

O problema da leitura que o Bauman faz dessa tal liquidez - especificamente em relação ao afetivo-sexual - reside em dois pontos:
1- é etnocêntrica (como infelizmente muito da sociologia o é), pois enquanto o projeto da modernidade se desdobrava sobre o ocidente entre cerca de 1880 e 1940/1950, havia diversos arranjos de relações - inclusive o que ele chamaria de relações líquidas - ocorrendo no mundo não-ocidental. Os escritos de Margaret Mead e Ruth Benedict são grandes testemunhos desse fato social nas sociedades que respectivamente estudaram;
2- Ao assumir que fomos modernos em algum ponto, Bauman acidentalmente é sexista ao aceitar que homens eram sujeitos à mesma solidez relacional que as mulheres foram durante sua pré-modernidade (que na verdade é a modernidade de todos os outros cientistas sociais), sendo que na verdade os homens sempre tiveram a liberdade para sair sendo líquidos em suas relações, enquanto a mulher - pilar de uma relação de aliança econômica em todas as classes sociais -, ficava restrita à vida caseira. Então fica dolorosamente implicado nos escritos dele que o problema das relações humanas atuais é a liberdade sexual das mulheres. Digamos que minhas colegas dos estudos de gênero não são muito fãs do finado.

Trocando em miúdos, o Bauman trata a pós-modernidade (que ele chama de modernidade líquida) e suas consequências como um grande problema, sendo que basicamente qualquer um que não seja uma pessoa como ele - europeia, com um bom padrão de vida, alossexual, heterossexual e homem - não trocaria essa modernidade líquida pelo que vinha antes nem com uma arma apontada para suas cabeças. Apesar do que parece, a crítica do Bauman é extremamente conservadora.